24 de novembro de 2007

MERGULHO EM MALTA - Day One



À falta de mergulho, vou passar a publicar o diário de uma viagem a Malta - DiveMates Trip - que efectuamos em Junho de 2007. Assim os meus amigos de viagem já não se podem queixar que eu não compartilho as minhas extensas crónicas. Não se trata do texto integral da crónica efectuada, mas apenas parte dela, dedicada ao mergulho. Espero que gostem, e que se revejam nas descrições. Foram excelentes dias de confraternização. Um agradecimento aos fotógrafos de serviço: Casimiro Sampaio e Alcidio Ferreira.


Então foi Assim:


ILHA DE GOZO - MALTA


O Gozo do Mergulho Radical


Depois de uma noite muito mal dormida, ao som do Expresso do Oriente (AFC), em que tive o azar de não adormecer primeiro, a após um duche de àgua fria para despertar, tivemos a primeira decepção com o pequeno almoço maltês do Hotel St Patrick´s. Uma torradinha e pouco mais. Mas enfim, a perspectiva do mergulho em Gozo é grande, e a ânsia de mergulhar é muita. Nem imaginamos o que nos espera.
No Centro St. Andrews Divers Cover fomos apresentados ao nosso guia, um espadaúdo e austero Suiço de nome Urs Lips, que fala um português muito perceptível. Após as formalidades normais de desresponsabilização do Centro de mergulho por qualquer fatalidade que nos possa acontecer e assunção antecipada de qualquer asneirada que possamos cometer, partida para o primeiro mergulho do dia, a bordo de uma camioneta a fazer lembrar o transporte de trolhas de um subempreiteiro clandestino para as obras de construção civil. Mas enfim, tudo vale, porque os mergulhos serão concerteza fabulosos.
Ao fim de vinte minutos de viagem em direcção ao Sudoeste, chegamos ao local - DWERJA POINT -.
O nosso destino seria logo o ambicionado Blue Hole e o gigantesco arco granítico conhecido como Azurre Window. Uma espécie de visita a duas maravilhas da natureza num só mergulho.
A paisagem do local, de tão bela, é avassaladora. Imponentes formações rochosas que nos assombram, em contraste com o Mar Mediterrâneo, que de tão pacifico ao largo, nos transmite uma sensação de segurança. Mas como não há bela sem senão, temos logo um primeiro impacto assustador com a entrada e saída do mergulho. Tal qual uma bela mulher, também os mergulhos por aqui se têm de conquistar com calma, respeito e carinho.
O Blue Hole, tal como 99% dos mergulhos efectuados em Malta, trata-se de um Shore Dive, em que temos que percorrer cerca de 200 metros com o equipamento às costas, pelo meio de uma escarpa mais ou menos íngreme. Fico desconfiado, e até um pouco desmotivado. Para mais quando vejo alguns mergulhadores a lutar denodadamente contra a rebentação para saírem, e a andarem aos trambolhões na àgua. Por qualquer razão o Instrutor falou mais tarde em “Wash Machine”. Aquilo parecia de facto uma entrada para uma máquina de lavar em pleno funcionamento.
Mas, eis que chega um outro instrutor, e informa que não há condições para o mergulho, pelo que o Urs decide que vamos fazer o INLAND SEA, ali mesmo ao lado, e com uma entrada muito mais pacifica e calma. Pelo menos era o que parecia.
Montados os equipamentos, fizemo-nos à àgua, e apesar de algumas inesperadas dificuldades na entrada, lá afundamos. A saída é de uma pequena baía, nadando-se até à entrada de uma formação rochosa, onde afundamos e seguimos através de um túnel, sempre com a parede pelo nosso lado esquerdo, para evitar o tráfego da barcos que por aí circula.
A informação prestada dizia que este era um mergulho fantástico, através de um estreito tunnel ou canyon que se alongava por cerca de 150/200 metros desde a pequena enseada onde entrámos até ao mar aberto. O inconveniente deste mergulho seria o constante circular de pequenas embarcações de turistas e pescadores no interior do túnel, logo aliviado pelo facto de a parede ser tão profunda que quase não oferecia risco de colisão. Felizmente quando mergulhamos, o tráfego de embarcações era muito reduzido.
Quanto ao resto, apenas a confirmação de que se trata de um mergulho fantástico, onde sobressai sem sombra de dúvida a visão do espectacular azul oceânico à saída do túnel para o mar aberto. Como a boca do túnel é grande, a luz azul intensa avista-se ao longe, e quando chegamos ao “open sea” é uma sensação formidável constatar a visibilidade de mais de 40 metros com uma enorme parede do nosso lado esquerdo. Saímos de um estreito túnel e entramos em Mar Aberto no verdadeiro sentido da palavra, pois que apesar dos 27/28 metros de profundidade que o computador detecta, estamos numa posição equidistante ao fundo que se avista. Sentimos que estamos a voar no Oceano. A vista quando se está a chegar ao “open sea” é de facto deslumbrante, e vai em crescendo à medida que vamos deixando a escuridão do Túnel e nos aproximámos do “Blue” do Mar Mediterrâneo. É como sair do mundo das trevas e entrar no mundo da Luz- Transcendentalmente imagino que seja esse o caminho a percorrer pelos pecadores no dia do Juízo Final. Depois de sairmos do túnel, e sermos brindados com a luz Azul, seguimos a enorme pedra, sempre do nosso lado esquerdo. Trata-se de uma parede que desce até cerca dos 52 metros, e a paisagem subaquática é de um belíssimo azul intenso. Quando os primeiros mergulhadores atingem 120 Bar, regressa-se , com a pedra do nosso lado direito. A desilusão é o pouco peixe avistado. Apenas alguns peixe papagaio, cardumes de castanhetas pequeninas, carapaus pequenos, e uma ou outra garoupa média. Em contrapartida, a visibilidade aqui é sempre superior a 40 metros. Ao chegarmos à entrada do túnel , e como somos nós a fechar o grupo, o Casimiro aproveita para tirar uma fotos contra-luz. Ficamos os dois sozinhos. Entramos no túnel, e a visibilidade esvanece-se, mesmo com as lanternas é nula. Sente-se que está muita corrente por causa da ondulação, que bate forte. Ao chegarmos à boca do túnel a fola, ou corrente de superficie é tal que nem agarrado a uma pedra me consigo suster para fazer o patamar de segurança. Deixo de ver quem quer que seja, e venho à superficie com dois minutos de patamar por fazer, o que me deixa quase enfurecido, esquecendo rapidamente a satisfação anterior. A saída é penosa e cansativa. Desequipar em cima do cascalho não ajuda nada à festa. Acho as condições de mergulho inaceitáveis, e confesso que por momentos me assaltou o pensamento de chegar ao hotel, telefonar para o aeroporto e saber se era possível regressar de imediato a Portugal. Pode parecer exagero, mas a falha do patamar de segurança deixa-me “stressado”. Eu não vim para fazer um curso de acesso aos fuzileiros. Estou de férias, e a comparação com o Mar Vermelho começa a ameaçar ensombrar o gozo de “Gozo”.
Acalmado pelo grupo de "Mates", fomos almoçar um frugal hamburguer, e preparamo-nos para o mergulho da tarde.
Depois de mais umas peripécias sobre os locais, o Urs, concluiu que só podíamos mergulhar em REQQA POINT REEF. O acesso à àgua, para variar, metia medo. A saída parecia impossível. Eu, ainda stressado pela manhã e pelas vistas dos locais de mergulho que íamos passando, afirmei logo alto e bom som que não mergulharia ali, que podiam meter os 20 euros do mergulho naquele sitio que toda a gente sabe, mas eu não mergulhava. Tal como o meu amigo Carvalho queria que se f…. a Foca da Madeira, também eu queria que se f….. os mergulhos em Malta. O Zé Videira hesitava. O fuzileiro do grupo - Alcidio - ansiava de adrenalina. O Casimiro e o Raúl, calmos, serenos e experientes, analisavam as condições.
Foi então que vemos uns mergulhadores sair da àgua com alguma aparente facilidade, pelo que todos os outros elementos do grupo decidiram que faziam o mergulho. O Casimiro, sempre um gentleman com as meninas, ofereceu-se para me levar a garrafa, incitando-me a mergulhar. Qual macho latino, recusei veementemente a gentileza, mas decidi equipar-me para ver o que dava. E, apesar da dificuldade de acesso pela pedreira, até nem correu mal.
O mergulho é numa enorme parede vertical, que vai afundando desde os 15 até aos 70 metros, recortada por inúmeras fissuras e pequenas cavidades. A medida que avançamos, vamos percebendo que é muito fácil afundar sem nos darmos conta da profundidade atingida. O mergulho decorre à volta da parede, com formato circular, e apanhamos corrente um pouco forte. A visibilidade do Azul é superior a 40 metros. Um azul inconfundível, um azul como nós imaginamos que o mar seja Azul. Um azul Blue. Quanto a peixe é que nada, ou quase nada. Muito pouco, e pequeno. Uns peixes papagaio e umas garoupas ou sargos isolados, e as sempre presentes castanhetas, muito pequeninas.
O mergulho, apesar da corrente decorre sem sobressaltos, com todo o grupo a deslizar no AZUL.
A cereja no topo do bolo estava guardada para o final, embora não para todos, só para os que seguiram o guia, e não se distraíram nas fotografias. Uma das muitas cavidades ou saliências, com formato circular, muito pequena , mas que permite a entrada de um mergulhador de cada vez, e uma subida dos 16 aos 6 metros, a que chamam CHIMNEY (chaminé). No interior duas paredes, que são estreitas, cobertas de uns belíssimos pólipos amarelos e rosa. No topo da cavidade há uma janela muito estreita mas que permite a saída de um mergulhador. Espectacular o efeito das bolhas de ar no tecto da cavidade, e a visão do azul intenso vislumbrado pela abertura por onde saímos. Como um écran Flat HD de última geração. Percurso fantástico. Como diriam os franceses, um “Grand Finale”. O mergulho termina com o patamar de segurança efectuado sem qualquer problema. A saída do local de mergulho, apesar de não ser fácil, não é tão complicada como à partida parecia, e tudo termina em bem, e de sorrisos abertos estampados na cara de todos. Afinal o que parecia impossível, não só se tornou possível, mas relativamente acessível, valendo sem dúvida a pena. E, por falar na dita cuja, lamenta-se apenas a falta de peixe, mas a paisagem é suficientemente impressionante e impressiva para nos deixar indiferentes.
Regresso ao Hotel na nossa carripana de assalariados clandestinos, duche retemperador e partida para a primeira refeição a sério nesta ilha outrora percorrida por S. Paulo. Destino: Restaurante Zafiro, mesmo ao lado do Hotel. Mais uma aventura. Depois de efectuados os pedidos, tivemos que ir alimentando o estómago à custa de descomunal quantidade de pão, tal a demora na chegada dos “Main Dishes”. Mas também aqui valeu a pena a espera, pois que o resultado final foi muito agradável, com uma excelente apresentação, e equivalente confecção. Após alguma conversa sobre as peripécias do dia, é hora de regressar ao quarto. É hora do Sud Express voltar a atacar. Mas para combater a turbulência, nada melhor que um Valium 5 mg, gentilmente cedido pelo Casimiro. Infelizmente só aguentou 5 horas, o que me leva a crer que o ideal seria um de 10 mg.